Há
histórias que precisam de lápis, caderno e um pouco de poesia. Começo assim a
falar da cidade de Murici, a bem- aventurada pela natureza.
Caminhavam
por essas bandas um povo trabalhador que, aliás, é característica nossa. Bom,
quem trabalha no campo e/ou viaja sabe que sombra é lugar divino para
descansar, assim, o pé de Muricizeiro passou a ser lugar de descansos,
encontros, conversas e abrigo. Ali nascia a bela Murici, banhada pelo Rio
Mundaú, visitada por Lampião e abençoada pelo Frei Damião.
A
partir daí, a história pode seguir o seu rumo e entre os vários aspectos que
poderia tratar, escolho o aspecto ideológico, e a minha ideologia é o povo. Muito
mais do que uma cidade que dominou histórica e religiosa duas outras cidades:
Messias e Branquinha, Murici é a cidade que abraça os seus. Inicialmente os
viajantes e trabalhadores, e depois um povo inteiro.
É
a cidade onde nasci, e vivo até hoje. Nela me sinto menos impotente, ando por
suas ruas, piso em alguns tapetes, olho algumas janelas e vejo o passar
constante de gente. Gente de perna fina, grossa, pequena, grande, torta,
vistosa, branca, amarela, preta, parda... que passam com seus toc toc,
sinalizando a vida que acontece.
Se
eu andar da minha casa uns cinco minutos em direção a pista nova terei a imagem
de um possível “cortiço”. É a portelinha que desperta brava e heroicamente os
seus, tenho a impressão de que lá o sol parece beijar mais cedo o chão. As
mulheres sentadas nas portas a conversar coisas mil; os homens a se despedir,
indo cumprir mais um dia árduo de trabalho; as crianças de pés quase no chão,
sem bolsas da Bárbie ou do Bem 10 vão à escola e parecem não acreditar em
futuro.
Não
sabem nada do amanhã, nem parecem preocupadas com isso, na verdade estão mais
preocupadas com a hora de voltarem da escola, pois o sol e/ou a chuva terminam
por tornar mais difícil a longa caminhada de voltar para suas pequenas casas.
Por
falar em casas, como Murici cresceu! À noite, a luz dos postes a deixam tão
enormemente visível; desaparecem as pessoas, não se conta nem vivos e nem
mortos. Tudo vira luz ou ausência, e um silêncio desafiador nos convida a
fecharmos nossas portas e esperar o nascer do sol.
Ás
04h30min da manhã a cidade começa a despertar; e, no ponto umas 05h30min
começam a se misturar estudantes, pacientes e trabalhadores; ás 06h20min o
ponto fica novamente vazio, parece ser dado uma pausa... sono. E, às 07h00min é
a vez do comércio dá os seus primeiros suspiros. Lindamente os estudantes
começam a desfilar a caminho das escolas, gente bonita demais! Emprestam
encanto, e saem de cena com uma naturalidade que parece ter sido ensaiado.
Nas
escolas, especialmente na Escola Estadual Professor Loureiro, que é aonde
estudei e hoje leciono, bom, lá os portões se abrem as 07h30min e, eu gosto de
chegar mais cedo e observar o meu povo, uns ainda com os olhos entreabertos,
outros com eles já devidamente maquiados e outros já acostumados a levantarem
cedo. As conversas no pátio, as gargalhadas, suas ousadias, tudo neles
encantam.
Ao
final das aulas, abrem-se os portões como se abrissem as cortinas da passarela,
é um desfile a céu aberto e o sol lança seu olhar para nós, guiando-nos ao
banquete em nossas casas.
A
tarde sucede igual à manhã; à noite, especialmente nos fins de semana, o ponto
de encontro passa a ser a Praça Padre Cícero, quem vem a Murici e não passa por
lá, não conheceu quase nada. Lá está os risos mais belos, os homens e mulheres
mais bonitas, a juventude em massa. No início da noite, os pais levam seus
filhos para brincar, é lindo demais vê-los lá! As 21h00min cede-se lugar para os jovens e adultos se divertirem.
Na
Praça Padre Cícero acontece um dos melhores shows da região. Os quatro dias de
Festival da Natureza; o primeiro dia é dedicado a show gospel, mas na verdade,
só são convidadas atrações evangélicas, então acredito que seria bom repensar o
termo, uma vez que gospel é um termo abrangente demais, ou então, e acredito
que seria a atitude mais coerente, fazermos de fato um show com bandas
católicas e evangélicas. Nos dias seguintes, as melhores atrações são chamadas,
e o povo faz uma festa linda. O festival da Natureza é a celebração da maior
parte da Mata Atlântica de Alagoas, que faz pulsar o coração de Murici. Bom, é
da Praça que sai um dos maiores blocos carnavalescos da região, “O Tudo Azul”,
tradição nossa que também estão manchando de sangue de gente.
Murici
virou uma mocinha linda! Encanta a todos, pena que a oferta de emprego não seja
o seu forte, e que muitos muricienses precisem viajar e/ou irem embora para
outros lugares. Pena que tenhamos que está acenado e chorando partidas.
Talvez
tenhamos que esperar muito ainda para que nossa cidade sustente os seus. Pois,
ela é como uma criança que sabe apenas encantar, faltando aprender a cativar,
cuidar e proteger.
Espero
ansiosa que nela reine paz, alegrias e que haja motivos para que mais histórias
sejam contadas. Que o povo que partiu sinta necessidade de voltar para rever
familiares, amigos, ruas e praças.
Murici,
é a cidade de um povo bom, Meu Deus! Um povo solidário, receptivo, alegre e
encantador. Murici é abençoada pela Mãe
da Graça!
Joelma Simões, natural da cidade de Murici.
Me chamo Wanderson Gomes. Assim como Joelma, sou natural de Murici/AL. Lendo esse texto, senti uma enorme alegria. Com muita propriedade em cada detalhe que cita, em cada história de vida que reflete, Joelma me lembra o escritor brasileiro Aluísio Azevedo, que propõe em sua obra "O Cortiço" detalhes tão ricos quanto aos descritos por esta muriciense. Parabéns, Joelma! Me dá um ânimo tremendo perceber que existe valorização da cidade, através de seu simbolo maior: o povo pobre e sofrido. E o tal de "terra dos Calheiros", "terra da bandidagem", "fim de mundo", "curral", parecem expressões enfraquecidas com tamanha beleza e simplicidade num texto bonito de ler, que derrete nos lábios e enche os olhos de lágrimas.
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