Dia desses, falei para uma turma com cerca de 120 estudantes que não toleraria nenhum tipo de piada de cunho homofóbico no ambiente. No momento, creio, pareci um pouco “seco” ou “duro”, mas era preciso não dar margem à dupla interpretação: era “não tolero” mesmo.
Explico.
Em maio deste ano, 2015, completei 15 anos de carreira como professor.
Comecei cedo, ainda calouro da UFPR, num pré-vestibular chamado “Em
Ação”, que ajudei a criar e que ainda existe em Curitiba, onde lecionam
estudantes dos cursos de licenciatura da Universidade.
Daí para chegar à educação privada, por onde já passei como professor de
cursinho, ensino médio e educação técnica, foi uma longa jornada e
hoje, uma década e meia depois, sinto-me maduro para debater questões
ditas paralelas, mas extremamente ortogonais, ao modelo de educação
brasileiro.
Em todos esses anos, sempre percebi o quanto um dos assuntos mais empurrados para baixo do tapete é a homofobia.
Para não falar do preconceito velado e violento das escolas de ensino
fundamental e médio por onde passei, ou mesmo no ensino técnico, vou
focar minha análise apenas nos cursinhos, onde atuo ainda hoje.
Olha, e confesso não saber de onde veio a ideia de que professor de pré-vestibular precisa ser humorista.
Que é preciso um bom humor, principalmente com viés motivacional, não
tenho dúvida, assim como não tenho dúvida que bom humor se expressa com
sorriso e com respeito.
Que é preciso, também, ser mais que um orador/explanador, e desenvolver
com os vestibulandos uma relação que pode beirar a amizade, no sentido
de servir de apoio nesse momento extremamente delicado da vida deles,
não há dúvidas.
Da mesma forma, que é preciso estabelecer uma dualidade entre
racionalidade e emoção, para acompanhar as variações de humor de quem
vive sobre a pressão casa/trabalho/futuro/cursinho, todos sabemos.
Mas e quando isso tudo se confundo com busca pela popularidade barata?
Aí entra a velha técnica do comediante: forçar a risada de uns com base na humilhação de outros.
Quando agem dessa forma — e eu creio ter agido assim em algum momento de
minha carreira de professor, não sou santo e nem puritano, sabemos — os
colegas de profissão humilham veladamente alguns alunos em benefício a
alimentar o ego daqueles “não incluídos” na humilhação.
Piadas de cunho racista, machista, segmentadadoras e, em especial,
homofóbicas, são feitas sem critério algum, destruindo a autoestima de
quem é vítima da gozação.
E, na maioria das vezes, a defesa não pode ser feita, seja por medo da
exposição, seja por entender não ser possível mudar a forma das coisas
acontecem.
Já presenciei diversas piadas de mal gosto, assim como músicas, frases
para se decorar tabelas e fórmulas, macetes para regras, etc, em que
incluem-se grosserias do pior gosto possível.
E, a cada dia, percebo o quanto a “maldade não se faz por mal”, e sim por desinformação.
Esses colegas, professores de carreira, pessoas de “nível de instrução”
acima da média, agem dentro de uma cultura nefasta de exposição da
diversidade e da diferença de forma vexatória e com discurso de
normalidade.
Ao fazerem piadas machistas, esquecem que, em média, 15 mulheres são
mortas diariamente no Brasil simplesmente por serem mulheres.
Ao fazerem piadas racistas, fecham os olhos — deles e dos alunos — para a
população negra morta diariamente pela violência e pela polícia, ou
encarcerada em nosso sistema penitenciário horrendo, que mantém mais
negros em situação de privação de liberdade do que quando o Brasil era
um país escravista.
Ao fazerem piadas homofóbica, tapam a luz do sol com a peneira sobre os
LGBTs agredidos, humilhados e mortos, todos os dias, em nosso país, só
por não viverem nas regras heteronormativas da sociedade e expressarem
sua diversidade e sua singularidade.
Só por priorizarem o amor a si mesmo e ao próximo em detrimento à repressão de sua identidade.
A difusão do ódio, mesmo velado, ou “sem querer”, através de
brincadeiras e piadas, é grave em essência. É mais grave ainda, quando
tratamos de pessoas em período de formação e/ou transição. Os alunos do
cursinho serão, em poucos anos, os profissionais, engenheiros, médicos,
professores, sociólogos, jornalistas, arquitetos, veterinários,
advogados, administradores, economistas, etc, que estarão à frente da
sociedade e precisam ter consciência do que somos e de onde queremos
chegar.
Não acho que professor deve ser exemplo, longe disso, mas acredito, isso
sim, que como cidadão, deve respeitar a todos e defender os princípios
básicos da vida em sociedade, da constituição e, principalmente, do
respeito ao ser humano.
*Luiz Henrique Dias é professor e escritor. Autor do livro O Amor Remove Caninos
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