Com a bênção dos orixás, revezamento da tocha
passa em Alagoas pela Serra da Barriga, local que marca a luta dos
negros por liberdade e igualdade racial no país
O desfecho do revezamento da tocha olímpica em Alagoas não poderia ter
sido em lugar mais especial. O esporte e a consciência negra sempre
andaram juntos. Ajudaram a modificar a sociedade, a derrubar muros.
Jesse Owens e Muhammad Ali, heróis das Olimpíadas, marcaram o nome na
história por ações pela igualdade racial e também pelos feitos no
atletismo e no boxe. O Quilombo dos Palmares, localizado na Serra da
Barriga, em União, marcou a resistência de Zumbi e a luta por liberdade
no Brasil.
O fogo olímpico e a história do quilombo se encontraram na manhã desta segunda. Pela celebração, até a chuva, que acompanhou quase todo o revezamento, deu uma trégua em Alagoas. O caminho de carro era sinuoso, em estrada de barro, e, para diminuir as dificuldades, a chegada da chama foi pelo alto, de helicóptero.
Na entrada, capoeira, cantos e batuques
africanos e um cenário que tinha vestígios do ponto de resistência dos negros
entre o fim do século XVI e metade do XVII. Algumas ocas traziam
informações, além de espaço para dança e uma casa de farinha. Em meio
a tudo, mirantes abriam uma paisagem que, por si só, fazia a subida valer a pena. Ainda tinha a história do lugar.
Professor de matemática, Francisco Viana conduziu a tocha ao lado de
representantes das religiões africanas, Pai Célio (Baba Omitologi), Mãe
Neide (Oya D'oxum) e Mãe Miriam (Labinã). Para ele, o momento durou mais tempo que as convenções do relógio.
- É indescritível. A gente é
tomado por uma emoção e só quem conduz um fogo simbólico desse que sente
como é gratificante. Existe uma energia muito grande aqui. Nosso Deus
criador e os orixás trazem para cá essa energia tão
positiva no solo sagrado de Zumbi dos Palmares. Então, é indescritível.
Venho trabalhando no Comitê Olímpico local, e hoje tudo se concretizou. E
eu soube ontem que ia ser o condutor aqui na Serra da Barriga. Fiquei
sem acreditar que ia trazer esse fogo simbólico, que traz a paz, a
prosperidade e une os povos - disse Francisco.
Sacerdotisa de matriz africana em Alagoas, Mãe Neide destacou a
luta negra pela liberdade, a importância histórica do Quilombo dos Palmares e os
Jogos Olímpicos como símbolo de fraternidade.
– Eu sempre digo que em cada coração brasileiro existe essa energia do Zumbi dos Palmares. Para nós, todos de matriz africana, é pura emoção estar aqui e participar desse momento. É muita emoção ver a tocha chegando nesse solo sagrado. É uma mistura de amor e fé. Aqui é útero que pariu a liberdade, a terra de Zumbi. A força dele está aqui hoje. Os Jogos Olímpicos acabam sendo esse símbolo de luta pela igualdade entre os povos.
– Eu sempre digo que em cada coração brasileiro existe essa energia do Zumbi dos Palmares. Para nós, todos de matriz africana, é pura emoção estar aqui e participar desse momento. É muita emoção ver a tocha chegando nesse solo sagrado. É uma mistura de amor e fé. Aqui é útero que pariu a liberdade, a terra de Zumbi. A força dele está aqui hoje. Os Jogos Olímpicos acabam sendo esse símbolo de luta pela igualdade entre os povos.
Há mesmo uma energia diferente em Palmares. A serra, lambida pela Lagoa
Mundaú, guarda os gritos dos negros livres, muita esperança e o som dos
atabaques de tantos rituais antigos. Imagens do quilombo e da tocha,
juntos, vão correr o mundo e orgulhar quem luta diariamente por
igualdade.
No Brasil, um nome em especial deve ser lembrado
nesse dia de reflexão. Adhemar Ferreira da Silva foi um dos maiores
heróis olímpicos do país. Negro, ele conquistou duas medalhas de ouro
nas Olimpíadas de Helsinque, em 1952, e Melbourne, em 1956, e
estabeleceu ainda recorde mundial do salto triplo. Com passadas largas,
abriu espaço no esporte e no tempo para o reinado de Pelé.
Parecia feriado. União dos Palmares se enfeitou para receber a tocha olímpica.
Grupos de música,
rodas de capoeira e crianças de várias escolas, carregando a bandeira do
município, estavam em festa. E não foi só a celebração de momento.
Moradora de União, Maria Barbosa lembrou que a preparação trouxe
melhorias também na infraestrutura da cidade.
- A cidade parou, mas foi
ótimo, todo mundo está muito animado, mexeu com todos. E foi bom também
que algumas obras ainda agilizaram por causa da passagem da tocha - celebrou Maria.
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