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domingo, 16 de outubro de 2016

Os melhores alunos contam os segredos do sucesso escolar

Gostar de estudar e fazê-lo com o mesmo sentido de prazer e descoberta com que se desfruta de outras atividades é algo que se aprende desde cedo, com amor e disciplina – ingredientes que os adultos só conseguem dar se estiverem presentes e atentos. Conheça métodos para cada idade e veja as dicas para os pais 

sto de ser “bom aluno” tem que se lhe diga. É ser bem-comportado, aprender a fazer e ter sucesso académico? E se for um “bom rebelde”, como no filme que juntou os atores Robin Williams e Matt Damon? Também pode ser um “bom aluno”? A resposta é sim. Basta ter condições para experimentar sem medo de falhar ou de ser deixado para trás.

Aprender a aprender, que resulta em boas notas, implica motivação, método e diversão, as bases para as crianças crescerem felizes. Por isso importa que, desde cedo, os adultos lhes passem a mensagem de que confiam nelas, de que estão lá para as ouvir, compreender e orientar. Isto aplica-se a pais e professores e é particularmente decisivo quando a “retaguarda familiar é menos favorecida, caso em que não podemos deixar os miúdos pelo caminho”.

Luísa Moreira, mentora do projeto Fénix, concebido para combater o insucesso escolar no ensino público, explica como se estimula o valor próprio, ingrediente que os bons alunos partilham, desde o primeiro ciclo: “Aos primeiros sinais de dificuldades na sala de aula, o professor, apoiado por outros docentes, dedica uma disponibilidade acrescida à criança impedindo que ela se agarre à ideia do ‘não vou conseguir’”. A professora, ex-diretora de uma escola do ensino básico, lembra que o projeto, de âmbito nacional, permite aos alunos “sentirem-se apoiados e capazes de acompanhar os colegas”. Sem esta alavancagem, o cenário pode ser outro, como atestam as conclusões do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), divulgadas este ano no relatório da OCDE: ser adolescente e viver em famílias economicamente desfavorecidas é um fator que pode conduzir a maus resultados escolares. Conclusão: as bases para se ser “bom aluno” cultivam-se cedo e são a missão de todos: comunidade, escola e família.

Atenção, rotinas e diversão

O ano letivo começa melhor se o cérebro estiver em forma. O que a ciência diz: só aos 25 anos é que o seu desenvolvimento fica concluído. O que fazer até lá: definir horários para as refeições, beber água fora delas e reduzir a comida “de plástico” ao mínimo e criar rotinas. O tempo de descanso e a hora de ir para a cama são as mais difíceis de cumprir, e os efeitos secundários não ajudam.

“A privação de sono traduz-se em excesso de cortisol e excitação, que se confunde com hiperatividade”, adverte a psicóloga e coach parental Cristina Valente. A autora do livro O Que Se Passa Na Cabeça Do Meu Filho (Manuscrito, 285 págs., €14,90) explica ainda porque é que os gadgets devem ficar fora do quarto.

Outro cavalo de batalha é a concentração, ou a falta dela, que aflige tantos pais no regresso às aulas. Filho, Presta Atenção! (Companhia das Letras, 170 págs., €12,50), que a psicóloga de desenvolvimento Ana Manta escreveu, inspirada no mais novo dos seus três filhos, apresenta sugestões e atividades divertidas para fazer em casa e “integrar emoções e sensações através dos cinco sentidos”. O terceiro ano é a altura ideal para cultivar a planificação do estudo, mas com bom senso: “Digo aos pais que o objetivo não tem de ser o ‘muito bom’ a tudo; ter ‘suficiente’ numa disciplina chega para um filho se sentir bem e confiante.”

Método e consciência emocional

Estar nas aulas como um zombie, depois de estudar horas a fio. Decorar matéria sem perceber como se aplica à vida prática. Faltar a aulas e trabalhos de grupo por causa das noitadas. Organizar-se só na véspera dos testes. Fórmulas que não funcionam por razões óbvias. Menos óbvio é o papel das competências emocionais e sociais. Mas, quanto mais conscientes delas, maior a garantia de sucesso escolar. Mostram-no os resultados do estudo financiado pela FCT sobre os efeitos das práticas de atenção plena (programa americano MindUp) numa amostra de 454 alunos e 20 professores do 3º ano do ensino básico. Joana Carvalho, psicóloga e responsável pela área da educação no Instituto Mindfulness, confirmou que “a maioria dos professores se sentiram mais realizados e atentos ao que se passava na sala de aula, e essas melhorias também se registaram nos alunos do grupo experimental.” Fernando Emídio, coordenador do 1º ciclo do agrupamento de escolas da Marinha Grande Poente, que entraram na investigação, sustenta que a gestão das emoções compensa: “As melhorias no rendimento deveram-se à maior disponibilidade para aprender, à redução dos conflitos entre pares e ao bem estar na sala de aula.”

Os bons alunos sabem isto. Aos 22 anos, Catarina Correia foi a melhor aluna da Universidade de Aveiro (média de 19 valores no curso de bioquímica), e deveu-o ao equilíbrio entre esforço e lazer: “Ia às aulas, organizava cadernos de matéria por disciplina e condensava os dados de várias fontes, mas há que saber descansar; sempre convivi com amigos e tive atividades fora das aulas.” Para outros, a autonomia é a chave do sucesso. “A partir do 7º ano tornei-me mais independente, pois a minha mãe responsabilizou-me pelos meus estudos”, afirma João Fonseca. Aos 18 anos, conhece bem o seu método – “de manhã estudava duas disciplinas, à tarde, outras duas, sempre sozinho” – o que lhe valeu ter 20 a todas as disciplinas em ciência e tecnologia (menos um valor a Educação Física) na secundária Dr. António Granjo, em Chaves. Por fim, as fases de transição são o teste da verdade. Que o diga Filipa Martins, 25 anos, que saiu com a nota mais alta das três escolas do Norte e entrou em medicina com média de 19,6: “Quando se passa do liceu para o ensino superior é um choque: o volume de matéria aumenta imenso; percebi que era impossível saber tudo e aprendi a selecionar.”

Dicas para os pais

A primeira vez que a criança vai para a creche ou para a escola nova não precisa de ser vivida com um “ai que se me parte o coração”. Ninguém melhor do que os filhos para captar e espelhar as emoções dos pais: quanto mais ansiosos eles estiverem, pior. O que fazer? Encare a compra e organização do material escolar como uma oportunidade para partilhar atividades e criar memórias futuras do início do ano letivo. As rotinas familiares continuam a existir, mas com ajustes: a roupa e a mochila preparadas de véspera, seguidas de um momento de descontração antes de dormir, permitem um despertar tranquilo e tempo para um pequeno-almoço ou viagem até à escola sem pressas. Durante a semana, é possível conciliar o tempo dedicado às tarefas escolares, em local próprio e com gadgets em modo silencioso, com lutas de almofadas e brincadeiras parecidas. O corpo agradece e a cabeça também, já que estar parado e em posturas incorretas cria tensão e mal-estar físico, com impacto nas funções cerebrais e no humor. Reserve alguns minutos do dia para desfrutar das interações com a prole, que dá muito valor à atenção dos crescidos, esses seres imperfeitos que os amam. E provam-no quando dizem “sim” e “não” sem vacilar e estão lá para ajudá-los a crescer, a serem crianças felizes e alunos saudáveis.

Métodos para cada idade

0 – 3 anos Constroem-se os grandes pilares da aprendizagem. Treino das capacidades psicomotoras, sociais e afetivas. Os neurónios mais usados mantêm-se, os outros desaparecem. Recomenda-se brincadeiras que permitam interagir, explorar os cinco sentidos e proporcionar prazer. As birras não devem ser levadas a peito pelos pais e o tempo de sono deve durar entre 11 e 14 horas.

3 – 7 anos Aprendem através do exemplo, por imitação e repetição, que fortalecem redes neuronais e o treino da linguagem e dos hábitos de estudo. Precisam de dormir entre 7 e 12 horas e de ter brincadeiras não estruturadas. A linguagem e a memória consolidam-se com hábitos de estudo e planificação: ambiente tranquilo, sala própria e material arrumado, tempo para os TPC. A personalidade começa a ganhar forma e a aposta recai nas tarefas e jogos que exijam paciência, controlo dos impulsos e capacidade de lidar com emoções básicas (medo, raiva, tristeza, surpresa, nojo, felicidade).

7 – 12 anos Aprendizagem das operações complexas (lógicas) e controlo de sentimentos. Investimento na organização do tempo e método; tirar notas nas aulas, 10 minutos de pausa por cada hora de trabalho em casa, mapas conceptuais, ler em voz alta, usar exemplos práticos, intercalados com tempos livres e atividades em grupo. Tempo de sono recomendado deve durar 9 a 11 horas. Mudanças hormonais da puberdade e treino das emoções secundárias (empatia, desgosto, frustração). Testam-se limites e consequências (responsabilidade) e dá-se início à gestão do dinheiro de bolso, saídas fora da escola e outras tarefas (TPC, arrumar o quarto, passear o cão). Erros de comportamento devem ser corrigidos à medida que surgem, sem excesso de autoridade – nem de permissividade.

12 – 15 anos Pensamento abstrato permite construir hipóteses e fazer planos a longo prazo. O despertar da sexualidade e das emoções complexas surge a par da experimentação e do aumento das distrações. Vale a pena apostar em atividades que promovam a resistência à frustração. O cérebro precisa de 10 horas diárias de sono e pausas frequentes dos estímulos luminosos (gadgets e afins). A influência dos pais é essencial, sobretudo na aceitação de pontos de vista discordantes e na atribuição de autonomia ao adolescente.

16 – 25 anos Cérebro mais apto a identificar erros e consolidar matérias, na interação com colegas. Recomenda-se 7 a 9 horas de sono. Pressão para o sucesso gera ansiedade, que pode reduzir-se se existir um plano de vida e exposição a experiências de contacto com diferentes caminhos possíveis. 

Fontes: Orientações internacionais e conversa com o neuropsicólogo Fernando Rodrigues e a coach parental Cristina Valente

Atividades extracurriculares: a mais ou a menos?

“Vai agora ou só quando já puder ir sozinho?”; “Deve continuar na música depois de ter más notas e arriscar-se a chumbar outra vez?”; “Ela quer fazer ioga. mas nós achamos que é melhor o karaté”. Pois. O tema constitui uma dor de cabeça para muitas famílias, mas a solução está no problema. E há alguns passos que pode seguir: 

- Observe a criança e perceba se ela tem uma parte do dia livre de regras. A criatividade manifesta-se nesses “espaços vazios”. Só depois deve ponderar atividades estruturadas. 
 
- Identifique os talentos dos filhos e o que os motiva (estar com meninos com interesses parecidos fora da escola, praticar um desporto em que se sentem confiantes, etc).

- Se tem filhos adolescentes que querem desenvolver mestria numa área sem prejuízo das responsabilidades escolares, encare a opção como uma mais-valia para a identidade e um meio de prevenir comportamentos de risco.
 
- Respeite as preferências deles (que hoje o são, mas amanhã talvez não) sem deixar que as suas interfiram no caminho e, pior, que a atividade se torne em mais uma fonte de stresse ou de pressão para o sucesso. 

- Lembre-se que a ideia é divertirem-se e treinarem capacidades que podem conduzir a novas amizades e papéis sociais e profissionais. 

Fonte: Visão

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