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quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

"Acho Inadmissível a Terra de Zumbi Não Ter um Festival da Música Negra" Douglas Lopes

"A AG FM foi o meu laboratório fundamental, lá eu podia errar, em Maceió não, não pode. Sou muito grato a Rádio AG FM."
Douglas Lopes


Marcelo: Você nasceu nas terras da Usina Serra Grande, por quanto tempo a sua família ficou por lá?

DL: Pouquíssimo tempo, dias. Minha família é toda palmarina. É que meu pai trabalhava em usinas de cana de açúcar e minha mãe o acompanhava. E eu achei de nascer exatamente quando meu pai saiu da Laginha (risos) e foi para a Serra Grande. Não tenho relação nenhuma com São José da Lage, tenho primos lá, mas, desde criança que moro em União. Só saí para nascer.

Marcelo: Você se sente mais lajense ou palmarino?

DL: Claro que palmarino. Minha vida foi e será aqui.

Marcelo: Seu pai sempre trabalhou em usina de açúcar e por muitas vezes tinha que se mudar com a família, você era pequeno, como se sentia nessa época?

DL: Não lembro de nada. Era muito pequeno. Só lembro quando morávamos no Caípe e muito pouco. Já da Rua Nova, tenho as melhores lembranças desde 4 ou 5 anos já estava lá, jogando bola no campo da Rua Nova, no time do Carlinhos Cabeleira ou no Vasco (time da garotada da rua), aguardando a montagem do parque de diversões para a festa do Padre Cícero, brincando de circo e outras coisas da época.

Marcelo: Em que momento sua família fixou residência em União dos Palmares?

DL: Desde sempre. Como falei minha família é palmarina. Sou sobrinho de Liége, Neriglissor, Vandete. Primo de Ferreira Neto, Vanda, Leonor, Cícero Magalhães (In memorian), Dadá, Assunção, Carol, Júnior Brinquinho e outros.

Marcelo: Aonde vocês vieram morar e quais as suas lembranças da sua infância e adolescência?

DL: Meu pai saiu da Serra Grande e voltamos para União e fomos morar num lugar chamado ‘Sede’ na Laginha, depois Caípe e finalmente na Rua Nova.

Marcelo: Onde estudou e qual sua formação hoje?

DL: Fiz o maternal no Jardim Infantil Maria Leal Feitosa, depois estudei da 1ª à 4ª séries no Grupo Escolar Rocha Cavalcanti, da 5ª à 8ª séries no Carlos Gomes de Barros (no oitavo ano ocorreu uma greve e fiz os quatro últimos meses no Mário Gomes, pois havia feito a inscrição para fazer a prova na Agrotécnica e iria perder se não transferisse). Fui aprovado no teste de Satuba e fiz o ensino médio lá, concluindo o curso de técnico em agropecuária. Fiz o curso de radialismo pelo CESMAC e depois NCA e fiz a graduação em jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Marcelo: Como começou a carreira de locutor?

DL: A chegada da Rádio AG FM foi fundamental. Achava fantástica a ideia de falar com muita gente ao mesmo tempo, o rádio é encantador. Só que nessa época eu estudava em Satuba, foi em 1991. Um sonho que pela distância era mais difícil. Fui alimentando este sonho, quando estava em Satuba ouvia Rádio Cidade, Gazeta FM e quando chegava a União ficava colado no rádio ouvindo Mauro Correia, Margarete Leão, Lurdinha, Luciene Peixoto, Kleber Marques e a Bethe Lins uma carioca que passou um bom tempo em União, lembram?. A história com a Bethe foi fundamental. Minha irmã Cicinha falou para ela que eu era louco por rádio e ela me fez o convite para aparecer lá, num domingo à noite fui, e fiquei sabendo mais ainda que aquilo era o que eu queria para sempre. Em 92 tive a coragem e com a minha mãe falamos com o então diretor seu Jaime Leão e ele autorizou que fizesse um estágio. Comecei a estagiar em maio de 1992 e depois a ter um programa de final de semana o inesquecível ‘OXIGÊNIO’. Após concluir o curso em Satuba o programa passou a ser diário e com o sucesso de sempre.

Marcelo: Por quanto tempo trabalhou aqui em União dos Palmares?

DL: De 1992 a 1996.

Marcelo: Como você foi parar nas rádios de Maceió?

DL: Por causa dos meus sonhos, da minha esperança, da minha fé, vontade de crescer. Fiz testes, ninguém entra em rádio de grande nível porque é bonitinho ou amigo de A, B ou C. Fiz uma campanha política em 1996 e o candidato que eu era o locutor perdeu (Zé Pedrosa) e eu falei para mim mesmo, ‘em União não fico’ (o clima estava pesado, coisas da política baixa de alguns da minha querida terra). Mergulhei nos testes e passei para a Rádio Cidade que era a mais ouvida da época. Chegando lá , o diretor recebera um convite para Gazeta FM e me convidou, aproveitei a oportunidade e estou há 14 anos na 94,1MHz (o tempo passa muito rápido).

Rádio profissional é uma pressão grande. Só comparo a time de futebol. Os locutores não podem ter problemas e levar para a rádio (entrou no estúdio deixa atrás da porta). Temos que ganhar sempre, estar bem sempre, o Ibope tem que lhe ser favorável sempre. Entenderam a expressão ‘PRESSÃO’? Não é fácil , temos problemas e você não pode dizer para ele: - problema apareça depois que eu tenho rádio hoje e preciso ficar bem. A vida é cheia de coisas inesperadas, mas a gente se adapta a isso. Ou muda de profissão, não é?

Marcelo: O que sentia com a concorrência em Maceió, onde é bem maior?

DL: Medo e estímulo. Você do interior, uma pessoa simples. Sentia medo, mas não deixava transparecer para ninguém, jamais. E buscava fazer o melhor que eu aprendi na AG FM, buscava a excelência, o estilo diferente, uma comunicação fácil, sem exageros e foi dando certo. A AG FM foi o meu laboratório fundamental, lá eu podia errar, em Maceió não, não pode. Sou muito grato a Rádio AG FM.

Marcelo: Você apresenta um programa de prêmios na TV, é garoto propaganda de uma rede de lojas e tem seu programa na Rádio Gazeta, se sente um vencedor?

DL: Ah! Faltou um (risos), sou jornalista- coordenador do Portal gazetaweb.com da Organização Arnon de Mello no período noturno. Muito feliz e grato a Deus e a Santa Maria Madalena por tudo que tem ocorrido comigo. Sei que não fiquei esperando que as coisas viessem, fui atrás, mas sem a permissão de Deus eu não chegaria a lugar nenhum. Sou muito consciente do que represento para muitas pessoas e para minha família.

Marcelo: Você indicou o Ricardo Valério para trabalhar na Rádio AG FM. Onde se conheceram?

DL: No NCA (Núcleo de Cultura Avançada). Quando paguei algumas matérias do curso de rádio, ele estudava lá. O Márcio Mitonori (AG FM) pediu que eu indicasse alguém e ele queria uma chance e está em União até hoje, aproveitou bem.

Marcelo: Quem são os outros locutores com os quais você mantém amizade?

DL: Amizade é difícil, pois não paro nunca, trabalho bastante. Mas sempre encontro o Kiko Viana, Kleber Marques, Mário Sérgio, Hermes Marques e outros e conversamos sobre tudo. Em Maceió, vem Gilvan Nunes, Mathias de Melo, Tony Melo, Geléia, Taty Campos, Fábio Lécio e outros.

Marcelo: Como é sua rotina em Maceió?

DL: Uma loucura. Pela manhã, fico a disposição de duas agências de propaganda para gravar material das Lojas Guido ou do Alagoas dá Sorte (gravo de 3 a 4 vezes por semana). Das 13h às 17h estou na Gazeta FM. À noite estou no Portal Gazetaweb.com das 19h à 00h: 00 ou até concluir as pautas.

Marcelo: Você é casado e tem filhos. Como lida com a vida em família?

DL: Procuro viver intensamente os momentos juntos, mostrar as minhas raízes, trago-os às festas daqui. Procuro fazer coisas com eles coisas que não tive oportunidade de ter com meus pais (viajamos nas férias). Meu pai morreu, eu tinha oito anos e minha mãe foi tudo para todos da nossa casa, uma luta difícil. Quando tenho tempo venho a União visito todo mundo e faço a festa sempre, tento aproveitar as poucas horas de folga.

Marcelo: Quanto aos seus filhos, é verdade que um que ser médico e o outro jogador de futebol?

DL: Como você sabe disso? É sim, tenho dois rapazinhos, William com 15 anos e o Victor, com 10 anos. O mais velho realmente quer fazer medicina, vem estudando muito para isso, é destaque na escola, nos simulados e vai chegar lá, se Deus quiser. Tenho uma sobrinha (Florbella) que faz medicina e ele está inspirado nela. O Vitinho é apaixonado por futebol, faz escolinha, mas também vai bem na escola. Incentivo em todos os aspectos e espero que o futebol seja só um hobbie, mesmo. Lá em casa o lema é: ‘estudar, estudar, estudar’. Vem funcionando, eles nunca ficaram numa prova. Até minha mulher voltou a estudar e está no 4º período de serviço social.

Marcelo: Conheceu sua esposa aqui em união dos palmares?

DL: Sim, na inesquecível Associação Atlética Palmarina, no 1º Baile das Bermudas, lembram? Invenção do Kleber Marques.

Marcelo: Você teve um irmão que faleceu, como era seu relacionamento com ele?

DL: Como qualquer relacionamento familiar, momentos bons e ruins. Mas, nos últimos dias da sua vida estava complicado, devido ao problema dele com o álcool. Eram anos de alcoolismo e todo mundo sabe o que ocorre com quem tem essa doença, perde os valores, o respeito. Minha mãe e minhas irmãs estavam com ele diariamente e não era fácil saber o que ele fazia com elas e eu ficar bem. Sofri muito a distância, mas sofri. Infelizmente o álcool destruiu sua vida. Relacionada a sua morte, tem uma coisa incrível que ocorreu comigo profissionalmente, tive que fazer o programa na TV enquanto o corpo era velado e voltar para o seu sepultamento, uma coisa que não espero ter que passar nunca mais ( após o episódio a empresa contratou um segundo apresentador para me ajudar).


"Fiz uma campanha política em 1996 e o candidato que eu era o locutor perdeu (Zé Pedrosa) e eu falei para mim mesmo, ‘em União não fico’ (o clima estava pesado, coisas da política baixa de alguns da minha querida terra)."

Marcelo: Como é ter uma mãe tão animada como Dona Elza?

DL: É o maior exemplo para qualquer pessoa do mundo. Minha mãe é muito querida. Uma mulher que perdeu os pais quando era criança, foi morar com os irmãos, passou grandes dificuldades na vida e sempre encontra um motivo para uma brincadeira, piada e fazer o outro sorrir. Sou muito grato por tudo, o lema ‘estudar , estudar, estudar” foi ela quem colocou na minha vida. E quero ter na idade dela a vontade de andar e participar das festas que ela tem. É um exemplo sensacional.

Marcelo: A sua relação é grande com União, isso se deve ao fato de sua família morar aqui?

DL: Também. Mas por ter vivido toda infância e adolescência nesta terra querida. Lembro dos meus amigos, professoras, ruas, jogos nos campos da Rua Nova e Sementeira com o Bangu do professor Maninho, a vida simples, mas, tranqüila que eu tinha. As procissões que acompanhava desde pequeno e outras boas lembranças que não tem empresa nem trabalho na TV ou no rádio que faça esquecer.

Marcelo: Como Você ver a cultura aqui em União?

DL: Precisando de um empurrão grande. A pasta tem que ter recursos próprios, autonomia. O poder executivo precisa incentivar mais. A gestão pública tem de desenvolver projetos de grandes eventos para a cidade que é o berço da liberdade e a viabilidade é garantida. Acho inadmissível a terra de Zumbi não ter um festival da música negra. Você observa em tudo que é lugar tem festival. É festival da cana, natureza, tomate, da pitomba e todos financiados pelo Governo Federal e a nossa terra não ter nada? , absurdo. Isso é falta de vontade política e de foco no assunto cultura que pode alavancar o turismo local.

Marcelo: Já foi a Serra da Barriga?

DL: Várias vezes. Desde pequeno subia a serra no dia 20 de novembro com minha irmã Adelma. Fui Lobinho, Escoteiro e fazíamos piquenique, era uma data esperada por todos nós. E dá-lhe farofa e pão com mortadela e outros (risos).

Marcelo: Você acompanha a política aqui?

DL: Sim, estou ligado em tudo. Quem faz, quem se omite, quem diz que faz e não faz, quem mente e só é bonzinho na eleição, quem só acompanha evento em União no ano eleitoral. Muito ligado sobre a política e a politicagem sacana, rasteira de muitos.

Marcelo: Eu encontrei você no 2º EPA e na procissão do mastro, quais outros eventos que você não perde aqui na cidade?

DL: Fiz pedidos a Deus e a Santa Maria Madalena e fui muito bem atendido. Então, tenho promessas a pagar anualmente; seja na Procissão do Mastro ou no dia 2 de fevereiro.

Quanto ao EPA, passou a ser obrigatório para qualquer pessoa que está longe de União, um evento maravilhoso. Falo com os colegas mudo a agenda, escala e dou um jeito de vir para minha terra.

Festa do Milho (Femil), mesmo sem a grandiosidade de antes, faço questão de vir. No carnaval ( olha a tinta) sempre passo os três dias em União, eu gosto muito do povo e da maneira como sou recepcionado na minha terra.

Marcelo: Douglas, qual a sua mensagem para os palmarinos?

DL:Tem uma frase do poeta português Fernando Pessoa, linda, que eu gostaria que cada conterrâneo que leu esta entrevista pudesse senti-la e entendê-la. Que diz assim:

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos".

Se estou vivendo tudo isso, foi porque fiz a travessia, e se, para novos lugares quero ir, novas travessias terei de fazer, se vai dar certo, não sei , mas, farei sempre o possível para que meus sonhos se realizem. Faça você também meu amigo, com que seus sonhos se realizem e não desanime nunca. Siga em frente, faça as travessias necessárias".