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quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Acusado de improbidade, Beto Baía é afastado da prefeitura de União dos Palmares

O Juízo da comarca de União dos Palmares afastou do cargo, em caráter liminar por 180 dias, o prefeito Carlos Alberto Borba de Barros Baía, o 'Beto Baía', acatando ação por ato de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Estadual de Alagoas (MPE/AL).


Na liminar, o Juízo também deferiu a indisponibilidade dos bens e o afastamento do sigilo fiscal do gestor e dos demais envolvidos nas irregularidades apontadas pela instituição ministerial.


Segundo a assessoria de Comunicação do MPE, outras quatro pessoas e mais duas empresas também são alvo das acusações, sendo apontados na participação de um esquema de fraude à licitação, que gerou ao Município um prejuízo de cerca de nove milhões e quatrocentos e trinta e dois mil.


De acordo com as investigações feitas pelo promotor de Justiça de União dos Palmares, Vinícius Calheiros, e pelo Núcleo de Defesa do Patrimônio Público (NDPP), Beto Baía, Adelino Ângelo da Silva, Ricardo Leão Praxedes – ex-secretário de Educação -, Renato Brandão Araújo Filho, Kitéria Blanche Nascimento Alves e Elizabete Maria Dias – esses três últimos, empresários da JB Locação de Veículos LTDA e da MIXLOC Locação de Veículos LTDA -fraudaram procedimentos licitatórios, falsificaram documentos, superfaturaram os preços dos serviços, pagaram por serviços que nunca foram prestados e favoreceram, nas contratações, protegidos políticos.


As irregularidades teriam começado em 2013, quando Beto Baía assumiu o cargo de chefe do Poder Executivo. Até então, a Associação dos Motoristas do Transporte Escolar de União dos Palmares (AMTEUP) era a entidade que alugava carros para o Município, após ter vencido um procedimento licitatório. O contrato firmado com ela foi no valor de R$153.980,00 (cento e cinquenta e três mil e novecentos e oitenta reais) mensais.


Ao tomar posse como prefeito, Beto Baía não renovou o contrato mantido com a AMTEUP e, por meio do procedimento de dispensa de licitação nº 08/2013, expediu pedidos de cotação de preços para as empresas PB Serviços Limitada EPP, JB Locação de Veículos LTDA EPP e Locadora Marajá LTDA, curiosamente, deixando de fora a Associação já referida.


Por ter apresentado proposta com melhor preço global – R$160.226,00 (cento e sessenta mil e duzentos e vinte e seis reais), a JB Locação de Veículos LTDA EPP foi a escolhida para, por 90 dias, prestar serviços de transporte escolar à Prefeitura até que a licitação principal acontecesse, o que não ocorreu até o momento. Além disso, o Ministério Público descobriu que o valor do contrato foi reajustado sem quaisquer termos aditivos ou justificativa, sendo elevado para R$220.213,40 (duzentos e vinte mil e duzentos e treze reais e quarenta centavos).


Além da JB, no ano de 2014, foi também contratada para prestação de serviços de transporte escolar a MIXLOC. Mas, apesar de ter que realizar o transporte de alunos, tal empresa não forneceu um único ônibus ao Município.


CEI


Segundo o MPE/AL, no relatório da CEI nº 12/2014, da Câmara de Vereadores de União dos Palmares, consta a informação que o procedimento de dispensa de licitação nº 08/2013 sequer foi homologado pelo Tribunal de Contas do Estado de Alagoas e estaria padecendo de “inúmeras irregularidades formais indicativas de fraude, como dispensa de licitação absurdamente montada e fraudada, feita às pressas sem observância das normas que regem a matéria, com erros grosseiros e até infantis”.


“A fraude é tão absurdamente clara, que a cotação da vencedora foi anexa ao processo depois do certame já estar em pleno andamento. (…) A fraude é continua no procedimento, quando observamos as folhas 67 a 69, que finalizam em tese o processo e onde aparece um dos grandes absurdos. Na pressa de arrumação da licitação, no extrato de contrato, bem como na ordem de serviço, a dotação orçamentária é rubricada como sendo de aquisição de veículos, equipamentos e material permanente, ou seja, expuseram outros elementos de despesa totalmente diferentes do objeto da licitação”, revela um trecho do relatório da CEI.


Em função dos dados contidos no documento elaborado pela Câmara, o promotor Vinícius Calheiros solicitou todas as informações relativas ao procedimento licitatório nº 08/2013, assim como a lista dos carros próprios da Prefeitura. Além disso, ouviu várias pessoas que confirmaram o esquema fraudulento. Após analisar os depoimentos e conteúdo dos documentos recebidos, a Promotoria de Justiça de União dos Palmares constatou, de fato, as ilegalidades praticadas pelo Município.


“Convém acentuar que o procedimento de dispensa de licitação foi marcado por propostas preenchidas a mão, por uma mesma pessoa, em formulários com timbre do próprio município, e pela existência de divergências entre o termo de referência contratual e as propostas apresentadas pelas empresas. Essas circunstâncias evidenciam que o procedimento não passou de uma grande farsa armada para contratar a JB pelo preço que era conveniente aos gestores ímprobos”, alegou o MPE/AL.


“Nada obstante, em relação aos serviços prestados a este município, a JB e a MIXLOC se apresentam como verdadeiras empresas de fachada. Isso porque elas não possuem em União dos Palmares um único veículo próprio: são todos subcontratados. Fora isso, seus gestores jamais tiveram contato com os motoristas contratados em União. E no que concerne à MIXLOC, é importante notar que os prestadores de serviços ouvidos por este Ministério Público não conheciam sequer sua existência. Tudo indica tratar-se de verdadeira “empresa fantasma. E ainda em relação a mesma empresa, é essencial destacar que sua sócia-administradora, Elizabete Maria Dias, que segundo os atos constitutivos da empresa detém cotas do capital social em montante superior a um milhão de reais, reside em um dos bairros mais pobres de Maceió, num sobrado, além de ser analfabeta funcional e não sabe sequer escrever o próprio nome”, também relatou a Promotoria.


Portanto, diante de tudo o que foi apurado e após analisar os valores dos contratos firmados, o Ministério Público chegou a conclusão que o dano ao erário foi de R$ 9.432.553,74 (cinco milhões e duzentos e vinte e nove mil e trezentos e setenta e sete reais e sessenta e cinco centavos), tendo sido R$8.424.107,40 (oito milhões e quatrocentos e vinte e quatro mil e cento e sete reais e quarenta centavos) causados pela JB e R$ 1.008.446,34 (um milhão e oito mil e quatrocentos e quarenta e seis reais e trinta e quatro centavos), pela MIXLOC.


Decisão


Para Renato Brandão Araújo Filho e Kiteria Blanche Nascimento Alves, ambos da JB Locação de Veículos LTDA, e Elizabete Maria Dias, da Mixloc Locação de Veículos LTDA, o Poder Judiciário determinou ainda a quebra de sigilo bancário de todas as contas de depósitos, poupança, investimento e outros bens, direitos e valores mantidos em instituições financeiras no período de 1º de janeiro de 2013 a 13 de outubro de 2015. Durante o curso da ação, as duas empresas estão proibidas de celebrar novos contratos com o Município. “[...] notadamente porque já existe documento dos órgãos de controle que foram realizados contratos fraudulentas com estas”, disse o juiz de Direito Yulli Roter Maia na decisão.

Fonte: Cada Minuto

O dia do Professor

Por Luís Fernando Praga

Joãozinho pega o coletivo diariamente às 5:30. Às 6:10 apanha o segundo ônibus que o deixa na porta da escola às 7:00. Cumprimenta alguns colegas e com sua pesada mochila entra ligeiro na sala para não atrasar o começo da aula. O professor Joãozinho atravessa a cidade, de uma periferia à outra para viver.

Viver, para Joãozinho, é fazer com que sua vida tenha algum sentido. É sentir prazer em aprender e poder ajudar pessoas a extraírem prazer do aprendizado. É transferir e trocar conhecimentos. É encontrar gente. É ter o que comer e onde morar dignamente. É tratar e ser tratado com respeito.

Jairo para em frente à escola e nota os olhares das meninas quando sai de seu carro esporte. Os meninos comentam e Jairo sente-se bem com a admiração das garotas e com a inveja dos garotos. Jairo mora a duas quadras daquela conceituada escola particular e, atraindo olhares, entra na sala atrasado e sem pedir licença à Cláudia, que pausa a explicação para que Jairo cumprimente e conte as novidades ao colega do lado.

Joãozinho tem uma classe com 40 alunos pobres, com histórias de privações e sofrimentos que comprometem o aproveitamento escolar. O professor sente que apesar de seu empenho, pouco do que diz é aproveitado. Nota, entretanto, que alguns alunos, como Janice, têm um brilho diferente nos olhos. É esse brilho, vindo do fascínio por aprender, que justifica todo o esforço empreendido por aluno e professor para estarem naquele lugar.

Cláudia vai pra escola de metrô e tem uma sala com 25 alunos, todos ricos, com histórias de abundância e prosperidade que comprometem também seu bom aproveitamento escolar. Cresceram acreditando ser melhores e mais dignos de viver do que outras pessoas. Os alunos de Cláudia se enxergam superiores a ela e consideram que não precisam de nada daquilo. Alunos com o olhar especial de Janice também existem naquela classe, como Humberto, e era apenas a eles que chegavam as palavras de Cláudia.

Apesar do desempenho escolar abaixo da média, os alunos de João são em regra muito obedientes, pois tiveram berço. Nasceram no berço de uma sociedade que afirma a todo instante que eles são piores que os demais. Que nunca conseguirão ter um carro ou uma casa como os da novela. Que se pegarem alguma doença banal irão morrer, pois não são ricos. Que jamais chamarão a atenção daquela paixão secreta, porque suas roupas são simples e puídas. Então, criados num berço que os fez crer que não valem nada, são submissos e passivos… enquanto não explodem.

Os alunos de Cláudia também tiveram berço. Em seu berço, Jairo e a maioria de seus colegas aprenderam que podiam de tudo, que eram a nata, que eram exemplos de sucesso e que todos desejam ser como eles. Aprenderam que estavam protegidos, pelas leis, pelo dinheiro e pelos muros e carros blindados, das injustiças, das doenças e dos pobres. Aprenderam nesse berço que são melhores que os demais e não devem prestar contas a gente de castas inferiores como Cláudia.

É complicado para João fazer seus alunos acreditarem que não são inferiores a ninguém, apesar do que dizem a sociedade e as novelas.

Cláudia tem dificuldades em mostrar a seus alunos que ter dinheiro não os faz superiores a seus semelhantes.

Enfrentar o desrespeito, a humilhação, a violência física e o assédio sexual de seus alunos é uma condição inerente ao trabalho de Cláudia. Ela precisava viver e seu viver é como o viver de João. Para comer e morar com dignidade ela se submete a dar aulas naquela escola.

Para completar-se como ser humano, em seu horário de almoço, Cláudia pega duas conduções, almoça no ônibus e chega à mesma escola da periferia onde o professor Joãozinho leciona de manhã.

João, para se alimentar e morar dignamente, em seu horário de almoço faz o caminho inverso e vai lecionar na escola particular onde Jairo estuda.

Quando Cláudia dá aulas na escola da periferia ela é mais respeitada do que na escola particular, mas ainda assim sofre abusos, pois alguns daquele alunos submissos lembram-se de terem aprendido que são inferiores a todo o resto, menos à mulher, e Cláudia é a oportunidade que esperavam para demonstrar algum tipo de superioridade e poder.

Mas o olhar de Janice misteriosamente compensa o perigo e a humilhação sofridos e Cláudia não desiste.

Jairo fica feliz quando Joãozinho entra na sala, pois agora pode exercitar seu preconceito de outra forma. Além de ser mais rico e poderoso que João, Jairo é branco e João é preto. A ignorância de Jairo o leva a entender aquilo como algo que rebaixe ainda mais seu professor, então Jairo abre sua caixa de ferramentas fascistas e piadas cruéis.

O olhar e os questionamentos de Humberto permitem que João releve as inconveniências infantis de Jairo e suporte passar por tudo aquilo.

À noite João e Cláudia se encontram em uma importante avenida da cidade. São grandes amigos e reivindicam melhores condições de trabalho para a categoria. Juntos, apanham de policiais que foram seus alunos naquela escola da periferia e que seguem ordens de políticos que foram seus alunos naquela escola particular.

Chegam a suas casas bem tarde, cansados e feridos, imaginando a difícil tarefa de enfrentar o dia seguinte. Não sabem explicar porque devem ir, mas sabem que irão para ver novamente os olhares de Janice e Humberto.

Percebem que Janice e Humberto são alunos diferentes, que não se deixaram iludir pelas supostas evidências sociais que os colocam em patamares evolutivos diferentes. São alunos que sabem que a sociedade está doente e acreditam que a cura está no conhecimento.

Cláudia e João ajudaram aqueles dois alunos a despertarem para o fato de que há uma infinidade de ignorâncias a se esclarecer.

Isso os tornou questionadores de certezas impostas e mais tolerantes com as ignorâncias alheias. Isso os impediu de se tornarem submissos a arbitrariedades ou arrogantes com quem passasse por situação de fragilidade. Isso os fez questionar os donos da verdade e os donos de pessoas.

Janice e Humberto não acreditam mais na sociedade que diz e age como se os negros, as mulheres e os pobres fossem inferiores. Não creem que alguém valha mais por ter mais dinheiro. Não se veem como superiores ou inferiores a ninguém, mas como gente, e sabem que gente tem sempre o que aprender e o que ensinar.

Professores como João e Cláudia conseguiriam facilmente outra ocupação que lhes garantisse um salário melhor para alimentar seus corpos, mas nenhuma ocupação poderia substituir aquela vocação, a única capaz de lhes provir um salário que alimente suas esperanças.

O tempo passou e João e Cláudia ainda lecionam. Ainda passam por situações difíceis e convivem com a injustiça diariamente, mas agradecem pela escolha que fizeram e se comovem nessa data, quando recebem a cada ano, mais e mais mensagens de Janices e Humbertos, cheias de carinho, notícias, questionamentos, reconhecimento, gratidão e no final há sempre um: “Você mudou a minha vida e isso não tem preço!”

Obrigado, prô!