Bons professores criam excelsas personalidades, desejosas de contribuir para a construção de uma sociedade mais inclusiva e igualitária e, nos tempos que correm, é mais necessário do que nunca
Numa altura em que o papel do professor é tão discutido,
defeitos são apontados e qualidades são, infelizmente por escassos, ainda
registadas, não poderia deixar de enfatizar o papel do professor enquanto
artesão.
Um professor, um bom professor, aquele que permanece na
memória dos alunos, é aquele que é capaz de
“moldar” o aluno, de desenvolver as suas capacidades e potencialidades ao
máximo e, acima de tudo, que vê para além do momento presente.
Quando recebe um aluno, após algumas aulas, independentemente
de critérios, avaliações ou outras burocracias, tem a capacidade de saber como
“trabalhá-lo” para que o rendimento do mesmo seja máximo e as eventuais
limitações se transformem em estímulos e não em fonte de desmotivações.
Um bom
professor preserva a individualidade de cada aluno e respeita-o como um igual.
Um bom professor é persistente, cauteloso e adapta-se e adapta os seus métodos
de ensino à realidade dos seus alunos: é dinâmico, criativo, crítico e
paciente, sem nunca descurar a exigência e a excelência no desempenho da sua
missão. É também curioso e atualizado, disposto a aprender com aqueles a quem
ensina.
Mais do que 25 alunos para ensinar, tem na sala de aula 25
indivíduos com ritmos e formas de raciocinar distintas, o que envolve não só
muita “ginástica mental” mas também uma enorme inteligência emocional para
lidar com a diversidade em causa. Paralelamente, o artesão trabalha o barro
calmamente e tem consciência, desde o início, que aquela argila que tem à sua
frente se transformará em algo fenomenal, se bem trabalhada, se lapidada e
moldada com a experiência que só um artesão dedicado e apaixonado consegue.
Efetivamente, o que diferencia um bom professor dos seus
pares é a paixão com a qual se entrega à profissão, a aposta que faz nos
alunos, ainda que estes, por vezes, não apostem nele... Arrisca, de modo
exímio, estratégias de ensino inovadoras, desafia dogmas e burocracias
infindáveis e coloca sempre o bem-estar e a aprendizagem do aluno em primeiro
lugar, apesar da desvalorização da qual é alvo por parte da sociedade civil e,
frequentemente, dos próprios alunos. Note-se a resiliência...
De fato, em Portugal, o número de artesãos está a diminuir
drasticamente com a massificação dos variados bens de consumo, entre os quais
peças de joalharia ou decoração de interiores. Da mesma forma, os professores,
os bons professores, aqueles que se assemelham aos artesãos referidos, estão
também em vias de extinção. São as “trilobites dos tempos modernos”. Como
publicado e discutido na comunicação social, os bons alunos não querem ser professores.
Porque será? Porque os modelos que tiveram no decorrer dos 12 anos de ensino
obrigatório não foram os melhores? Porque as perspectivas de construir carreira
são mínimas e enfadonhas? Porque é uma profissão desvalorizada na sociedade?
Porque as regalias são escassas comparativamente com os deveres e
obrigações?
Da mesma forma, a pergunta “Porque é que a figura do
professor perdeu o prestígio com o decorrer dos anos?” deverá ser levantada e
discutida, na medida em que a educação é o pilar de qualquer sociedade.
E se o papel do principal veículo de conhecimento é colocado em causa,
considero que se torna urgente a discussão dos objetivos do sistema de ensino
português e o meio para os atingir.
Gostaria de ressalvar que não está aqui em causa qualquer
desumanização do mesmo. Porém, um bom professor constitui uma ferramenta para o
sucesso do determinado grupo de alunos pelo qual é responsável. Tal como o
artesão é um veículo para a construção de uma peça, de uma obra de arte, cabe
ao professor transmitir o conhecimento, explicar as suas aplicações ao cotidiano e permitir a compreensão das matérias lecionadas da parte dos
alunos. Para além de que estimula o seu pensamento crítico e crescimento
enquanto ser humano equilibrado e sensibilizado em relação à sociedade na qual
se insere. Não será esta a verdadeira obra de arte?
Não nos podemos esquecer que o melhor cientista, o melhor
atleta e o melhor acadêmico têm algo em comum nos seus percursos: indivíduos
que os inspiraram a superaram-se a si próprios e que, mais importante do que
qualquer outro ato, que confiaram e acreditaram, por vezes, com várias razões
para não o fazerem, que aquele aluno seria capaz de algo de extraordinário.
Bons professores criam excelsas personalidades, desejosas de contribuir para a
construção de uma sociedade mais inclusiva e igualitária e, nos tempos que
correm, é mais necessário do que nunca.
Nos dias que correm, embora possa não
ser economicamente possível satisfazer as regalias às quais os professores têm
direito, é fundamental que, em alturas de crise como estas, estes recordem,
carinhosamente, as razões que, há alguns anos, os levaram a enveredar pelo
ensino e que, simultaneamente, se lembrem de todos os alunos que os admiram e
guardam na memória as suas aulas, conselhos e excelência.
Fonte: https://www.publico.pt/p2