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sexta-feira, 5 de abril de 2013

Nota em apoio à ocupação de terra em União Dos Palmares

Foto Tribuna União
No último dia 28 de março (quinta feira) trabalhadores da Usina “Lajinha” e aproximadamente 120 famílias sem terra ocuparam as terras de duas fazendas localizadas no município de União dos Palmares e de propriedade do deputado federal e ex candidato a governador, João Lyra (PTB), um dos maiores usineiros do estado de Alagoas.

A ocupação foi o meio encontrado pelos trabalhadores de reivindicar o não atraso no pagamento dos seus salários por parte da usina. Em reportagem vinculada na impressa local, um dos trabalhadores afirma que “prometeram pagar, e o que pagaram não dá pra sobreviver, não dá pra comprar comida”. Este atraso dos salários dos trabalhadores se soma a tantos outros problemas vivenciados historicamente no estado de Alagoas no setor sucroalcooleiro.

Além dos atrasos, os baixos salários, as condições de trabalho análogas ao trabalho escravo, ausência de políticas públicas, e o não cumprimento das leis trabalhistas fazem parte do dia a dia da maioria dos trabalhadores do campo vinculados as usinas de cana de açúcar alagoanas.

Todas estas relações vivenciadas no campo têm como pano de fundo os lucros dos usineiros que, com as crises econômicas do capitalismo, têm sidos ameaçados. A saída para garantir a recuperação das taxas de lucratividade de suas usinas é por meio da intensificação da produção, do pagamento de menores salários e do desrespeito às leis trabalhistas. Para tanto, é imprescindível o auxilio dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e toda a máquina do estado para garantir que tamanhos absurdos possam acontecer. Infelizmente, em Alagoas, as mesmas famílias que exercem tamanhas arbitrariedades no campo, são as que ocupam os cargos de alto escalão do estado.

Além disso, a privação dos direitos e condições dignas de vida para a maioria dos trabalhadores do campo só tem a colaborar com a dominação política e ideológica da “elite” formada por pouco mais de 25 famílias que dominam o estado, visto que, sem o mínimo de condições para se manterem, acabam se subordinando à “ordem natural” das relações políticas e econômicas em Alagoas.

A ocupação das terras da usina “Lajinha”, com a derrubada dos pés de cana de açúcar e plantação de culturas alternativas, vem na contramão dessa lógica perversa que há tempos massacra o povo sofrido de Alagoas. A luta que está em curso em União dos Palmares mostra, não apenas aos próprios trabalhadores daquela localidade, mas também ao conjunto da classe trabalhadora, que só a luta e a ação direta podem garantir melhores condições de vida a toda a sociedade. Por isso:

• Desapropriação da fazenda já! Para dar conta das dívidas com os trabalhadores;

• Que os trabalhadores possam fazer a gestão e garantir o pagamento dos débitos trabalhistas e também, com produção alternativa, garantir o seu sustento e de suas famílias.

Espaço Socialista Alagoas, Abril de 2013.

Uma luz sobre Palmares

O sol se põe por trás da Serra da Barriga, em União dos Palmares (Foto: Severino Carvalho)

Morei em União dos Palmares de 2001 a 2003. Fui residir na terra do poeta Jorge de Lima em razão da profissão de jornalista, onde desempenhei a função de repórter da Sucursal da Gazeta de Alagoas. Ali, dei os meus primeiros passos no jornalismo impresso, depois de graduado.

Na vida cotidiana, fiz amizades sinceras em União e, por isso, sempre volto ao município para rever os bons e velhos amigos. Quando morava por lá, minha residência tinha, do quintal, uma vista privilegiada de uma das faces da Serra da Barriga, coração do Quilombo dos Palmares, maior refúgio de negros sublevados das Américas, onde viveram mais de 20 mil pessoas, entre 1597 a 1695, sob o comando dos líderes Ganga-Zumba e Zumbi.

Subi a Serra da Barriga diversas vezes, em datas especiais como o 20 de novembro (Dia da Consciência Negra) e em dias comuns. “Mas não tem nada o que se ver lá em cima”, retrucavam algumas pessoas; pasmem, a maioria moradoras do próprio município.

Posso afirmar que em todas as ocasiões senti a emoção de estar em lugar único no planeta. Ali existe história, a história do Brasil que nasceu índio e que se fez negro e pelas mãos deste. Pesquisas arqueológicas mostraram que antes mesmo da chegada dos escravos rebelados, o lugar fora ocupado pelos indígenas. Fragmentos cerâmicos produzidos pelos dois grupos étnicos foram e ainda podem ser encontrados no chão de Palmares.

Ficava matutando lá do quintal de casa e quando estava com os pés sobre o platô da Serra: “Como pode o poder público não conseguir preservar, fomentar e manter viva toda essa riqueza histórico-cultural afro-brasileira? Como pode União dos Palmares não desfrutar das riquezas geradas a partir desta atividade turística ainda tão tímida no município? Como pode parte de sua gente desconhecer a própria história?

Vivenciei de perto a luta das entidades negras palmarinas travadas para, naquela época, fazer com que o governo do Estado priorizasse a Serra da Barriga como centro das festividades alusivas ao 20 de novembro; para que Zumbi fosse reverenciado, em terras palmarinas, não só na data maior, mas durante todo o ano e para que a Fundação Palmares deixasse de gerir todo aquele patrimônio de forma remota, lá do Planalto Central, centrando definitivamente os pés em União.

Assisti e escrevi sobre a revolta dos cidadãos palmarinos quando o governo do Estado, à época, desperdiçou quase R$ 300 mil numa vila cenográfica em terras particulares, desprezando o solo sagrado da Serra da Barriga. A vila, assim como o dinheiro público, desapareceu. Também testemunhei a cobrança para que as pesquisas arqueológicas tivessem seguimento e trouxessem resultados práticos, expondo os achados em União dos Palmares.

Lembro ainda da reivindicação principal e recorrente: a melhoria do acesso íngreme à Serra. Tentativas de melhorá-lo até foram feitas, mas sem atentar aos cuidados técnicos de se realizar intervenções em um sítio arqueológico. Muitos artefatos se perderam, carreados pelas pás das motoniveladoras.

No presente, a estrada que leva ao coração de Palmares, a 500 metros de altitude, ainda não é das melhores. No platô, o governo federal construiu o Parque Memorial Zumbi dos Palmares que passa, no momento, por uma revitalização iniciada em janeiro e que deve ser finalizada em junho.

Quando o parque estava em operação, era possível conhecer, em quatro idiomas, por meio de ilhas dotadas de equipamentos de áudio, um pouco da história do Quilombo dos Palmares. Mas, antes mesmo da intervenção, o parque já funcionava de forma precária. Numa manhã de domingo, subi a Serra com um grupo de amigos e não encontramos um guia sequer. As estruturas onde deveriam funcionar os restaurantes e lanchonetes estavam vazias. Soube que o poder público deveria fazer a licitação para o uso e funcionamento daqueles espaços, coisa que nunca fez.

Um fio de luz porém começa a iluminar a Serra da Barriga e toda a região por onde se irradiou Palmares. Por meio da Instância de Governança da Região dos Quilombos, poder público e atores privados dos municípios de União dos Palmares, Murici, Ibateguara, São José da Laje e Viçosa, buscam, enfim, desenvolver o turismo de forma regionalizada, lastreado na riqueza histórica, cultural e natural desta parte do Estado de Alagoas.

É sobre as ações específicas deste modelo de gestão descentralizada do turismo, implantado no País pelo Ministério do Turismo, e os projetos para tirar do ostracismo a região dos Quilombos, que tratarei na próxima postagem. 

Severino Carvalho é jornalista formado em Comunicação Social pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal), repórter da Sucursal Maragogi da Gazeta de Alagoas e editor do caderno Municípios.