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quinta-feira, 27 de junho de 2013

Os novos guerreiros da Terra de Zumbi

 Grupos lutam para manter valores conquistados a ferro e fogo

O povo sobe a serra e Zumbi desce sobre ela. Vinte de novembro é o Dia da Consciência Negra, data em que morreu o líder da maior resistência contra a tirania da escravidão, no longínquo ano de 1695. Até hoje, 317 primaveras depois, o espírito guerreiro do grande Quilombo dos Palmares ecoa como tambores na linha do tempo. E repercute na alma das novas gerações. “Zumbi é a serra”, resume o B-Boy Chokito, dançarino de break nascido em União dos Palmares há 17 anos e registrado no cartório como Eves Silvestre da Silva.

A terra de Zumbi tem novos guerreiros negros. Eles lutam por arte, cultura, educação e respeito para manter os valores conquistados pelos antepassados a ferro e fogo. Suas armas são os versos do hip hop, os passos da dança de rua, o grafite, as redes sociais, o cineclube e outras artimanhas que nem o mais astuto quilombola poderia imaginar. As raízes e a lógica da capoeira, do candomblé, do jongo, dos batuques e do dendê são mantidas, mas tudo com um elemento novo: o gingado do século 21.

Eles se reúnem em grupos como o coletivo “A Fábrica”, a trupe de dança “União Quilombrothers” e oficinas de stencil, com o grafiteiro e rapper Zulu, para reforçar a batalha contra o preconceito e pela autoafirmação. “Há uma nova geração do movimento negro, com grupos culturais que surgem aqui. Os primeiros movimentos aconteceram há alguns anos, mas foram trazidos de fora. Foi preciso vir umas freiras e um padre do Canadá para as primeiras bandas afro daqui serem criadas. Hoje é diferente”, explica Zema Ferreira, do coletivo A Fábrica.
Formado em História, o blogueiro José Minervino afirma que o povo da cidade teve preconceito contra a sua própria origem, por muito tempo. “União dos Palmares não tinha um apreço por sua própria história, mas essa coisa tem mudado de forma lenta e gradual”. Para Minervino, é preciso fazer uma reflexão sobre “a invasão de pessoas que vêm para cá dizer que nós somos negros, remanescentes quilombolas”. “Não era necessário vir gente de fora ensinar para nossas crianças quem foi Zumbi dos Palmares”, completa o blogueiro.

A cor da pele não importa tanto. Nem precisa ser tão escura para o jovem palmarino se afirmar negro porque a etnia está no sangue, a consciência está no pensamento e o orgulho, na alma. “Eu me considero negro, é assim que respondo no censo, sou negro sim, é melhor porque o negro é mais puro, o termo moreno é preconceituoso, é uma forma de fazer o cidadão renegar as suas raízes, assim como o termo mulato, que vem de mula”, dispara o rapper Zulu Fernando.

A praticante do break, Mônica Lima Soares (a B-Girl Mony), afirma que a consciência negra é a liberdade que merece respeito. “Eu sou de União dos Palmares, a terra de Zumbi, houve uma grande guerra aqui, travada por um povo resistente”. Os heróis dessa turma não são mais os mesmos. Com 22 anos, B-Girl Mony lembra que quando era criança sua maior referência era a Power Ranger Rosa, heroína japonesa da televisão. Hoje, Zumbi dos Palmares é o seu grande herói. O B-Boy Chokito trocou o superman e o homem-aranha por Zumbi e os quilombolas.

“Zumbi é muito mais do que um grande guerreiro que lutou pela liberdade, é uma pessoa histórica, um símbolo que merece respeito e valorização, ele foi e ainda é um grande herói, o nosso herói”, defende o adolescente Chokito. “Os Power Rangers era uma fantasia de criança. Tudo que temos aqui, Zumbi, o quilombo, a Serra da Barriga é uma realidade, a nossa realidade”, completa a B-Girl.

Para estes meninos, a consciência negra é universal, não tem fronteiras. Eles sabem que rap, break e hip hop são manifestações de rua norte-americanas, mas destacam que tudo veio das mesmas raízes africanas que formaram o Quilombo dos Palmares.

 MAURÍCIO GONÇALVES - REPÓRTER
 JOSÉ FEITOSA - FOTO

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