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sexta-feira, 11 de maio de 2018

"Sua mãe era do contra? A minha era" Por Gednéa Santos

 Davi e Gednéa 


Não lembro exatamente com que idade fui ao circo pela primeira vez, recordo-me que era muito pequena. 

Meu irmão, Léo, foi a pessoa responsável a me apresentar àquele fantástico lugar, sai dali acreditando, verdadeiramente, que era uma trapezista.

Minha mãe, vez por outra, surpreendia-me pendurada no mosqueteiro de sua cama, ela não entendia, mas aquele era o meu único instrumento para treinar minhas habilidades circenses.

Quando menos esperava, ouvia um urro: “Menina, esse mosqueteiro não aguenta seu peso, você vai se arrebentar aí de cima!”

Descia muito triste e frustrada, no ápice do meu tão esforçado desempenho, ela acabava com o meu sonho de trabalhar no circo.

Naquela idade tinha plena convicção que minha vocação era ganhar a vida no circo, porém, minha mãe não entendia nada sobre meus objetivos infantis, sempre me rebatia com suas chantagens emocionais dizendo: “Vai trabalhar no circo? Então vai sozinha. Porque nem eu, nem seu pai temos vocação para ser artista de circo.” 

Minha intenção não era vê-los trabalhando no circo, eles só precisavam ser meus pais, cuidar de mim, só isso. Quem iria trabalhar seria eu, ora!

Por fim, minha mãe sempre terminava a conversa com aquela risadinha irônica, coisa que detestava.

Aguardei ansiosamente por um bom tempo a chegada do próximo circo à minha cidade, quando o circo do HE-MAN atracou por aqui, já havia desistido de ser trapezista, toda minha dedicação estava voltada para ser uma ginasta, para isso, tinha que no mínimo abrir escala e só se abre escala praticando, como sempre, vinha minha mãe com os exageros dela, e gritava: “Menina, você vai se partir ao meio!”

Nunca soube exatamente o porquê dos extremismos de minha mãe. Deixei de praticar minhas técnicas em casa, tive a brilhante ideia de me exercitar ao ar livre, lá nos corrimãos da entrada da AABB (Associação Atlética Banco do Brasil), logo alguém me viu de cabeça para baixo executando minhas atividades acrobáticas e correu para contar a minha querida mãe.

É possível imaginar o alvoroço que foi quando ela recebeu a tal notícia. Não lembro mais qual foi a punição que recebi, contudo, não foi suficiente para me impedir de treinar às escondidas.

Cresci na Rua Boa Vista, vulgo Terra Cavada, o fundo da minha casa encontrava o muro da AABB, os dias de sábado e domingo eram sempre muito animados, ali era o ponto de laser favorito da elite palmarina. Adorava ouvir do meu quintal o barulho do tchibum das pessoas pulando na piscina.

Meu alvo já não era mais ser trapezista, muitos menos ginasta, queria aprender nadar, a piscina do clube era exclusivamente para os associados e infelizmente não era sócia de lá.

Na minha pacata cidade não havia muitas opções para a prática da natação, só se aprendia nadar na piscina dos sonhos que era na AABB, em alguma casa com piscina (não conhecia ninguém que tivesse uma aqui em união) ou... no Rio Mundaú.

Das três alternativas qual foi mesmo a que me restou? A terceira, claro!

O problema é que minha mãe era osso duro de roer, convencê-la de que meu único meio para aprender nadar era o Mundaú, exigiria de mim muita paciência, insistência e criatividade. 

Precisava tentar, o máximo que iria acontecer era receber um “não”, como de fato recebi, não um, mas vários “nãos”.

Foram muitos argumentos para fazê-la acreditar na minha mais nova e fabulosa concepção. Não adiantou muita coisa, ela era dura na queda, não cedeu de jeito nenhum.

Os pensamentos de minha mãe eram sempre muito pessimistas em relação aos meus propósitos. Precisei abrir mão das minhas possíveis aulas de nado sincronizado no Rio Mundaú o qual margeava o final da rua onde morava, meu sonho de ser nadadora por um triz não foi concretizado, tudo porque passei a ter a impressão de que todas as vezes que tocava nesse assunto, minha mãe era tomada por um pavor repentino, longe de mim ser a causa do infarto do meu único e precioso tesouro. 

Além dos típicos exageros de minha mãe, ela era um tanto dramática e totalmente do contra.

Definitivamente do contra.

Contra qualquer perigo que pudesse cruzar meu caminho; 
Contra qualquer situação que pudesse machucar a sua cria;

Contra qualquer distância que seus olhos não conseguissem me alcançar. Minha mãe era do contra, mas jamais poderia ser o que sou, se não fosse suas contrariedades às minhas inocentes vontades.

O contra de minha mãe, de alguma forma, sempre foi minha barreira de proteção.

De maneira divertida essa é uma homenagem à minha saudosa mãe: Cicera Laurentina dos Santos, que tudo fez para que hoje me tornasse quem sou. Se antes eu achava que ela era do contra, meu filho que não me avalie, pois sou a versão dela um pouquinho melhorada, ou seria, piorada?




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