Preconceito resiste ao Terceiro Milênio, no solo sagrado de República dos Palmares
“Minha amiga branca disse que não pode ser minha amiga porque sou
preta”. A frase choca, mas saiu da inocente boca de uma menina de sete
anos de idade. Tainá ainda é uma criança, mas já experimentou na pele a
pior face do ser humano: o preconceito. Com certeza sua amiguinha branca
não sente verdadeiramente qualquer desprezo por ela, mas repete
paradigmas que lhe foram ensinados.
E justamente para combater esta “cultura” de menosprezo aos negros e
de “apartheid” que insiste em permanecer na sociedade brasileira, foi
instituído o Dia da Consciência Negra. Dia 20 de novembro marca o
aniversário de morte de Zumbi dos Palmares, líder negro que fundou o
Quilombo dos Palmares no século XVII em terras hoje de União dos
Palmares.
Alagoas, pioneira na resistência dos negros à escravidão e à
submissão racial aos brancos, ainda possui uma população muito
tradicional e um considerável grupo de pessoas com forte vínculo
coronelista.
A ativista Arísia Barros, fundadora do Instituto Raízes de África,
comentou o arcaico comportamento de parte da população alagoana. Para
ela, Alagoas é um dos estados mais racistas do país. “A população negra
do estado de Alagoas, por conta de uma cultura asfixiante que busca
impedir o acesso a releituras históricas, é penalizada pela premente
ausência de políticas estruturantes”.
Arísia reconhece que houve avanços, principalmente no que concerne à
legislação brasileira de proteção à população negra. No entanto, também
aponta para a resistência de instituições públicas na implantação da
letra da lei. “Alagoas foi o primeiro estado do Brasil a estadualizar a
Lei Federal que tornou obrigatório o estudo da história de áfricas e
afrodescendentes nos currículos de todas as escolas brasileiras, mas a
Lei Estadual nº 6.814/07 tornou-se letra morta pelo desconhecimento e
falta de vontade política”.
Os quilombos, que ainda existem em Alagoas e por muitos estados
brasileiros, continuam bolsões de miséria, sem cuidados especiais e
proteção à cultura negra, a própria história negra local pode estar
fadada à extinção. Em muitas comunidades quilombolas de Alagoas, segundo
a ativista, “homens e animais tomam água no mesmo poço”.
A materialização da imagem que deveria chocar, na verdade, tem sido
aceita pela invisibilidade e naturalização da marginalização do negro,
principalmente em Alagoas. Onde, segundo pesquisas, é dos lugares mais
perigosos para o negro, o pobre e o favelado, o que piora se a pessoa
reunir as três características.
Preconceito em Alagoas é mais que desprezo, mas uma cultura
A professora Márcia Susana Lima, coordenadora do núcleo de identidade
étnico-racial da secretaria municipal de educação de União dos
Palmares, respeitada pesquisadora sobre a invisibilidade do negro,
aponta que a maior carência da população negra em Alagoas é sua
participação nos vários setores sociais.
Salientando ainda que é necessária uma equidade na educação pública,
nos vários âmbitos, desde a educação básica até o ensino superior. “Esse
acesso precisa ser mais democratizado, dando condições justamente para
que o negro tenha as mesmas possibilidades que todas as outras pessoas”.
Para a professora, o preconceito que o negro ainda sofre em Alagoas
não é questão de desprezo, mas de cultura. “Devido à naturalização do
próprio racismo, da inferiorização da população negra, há lacunas que
precisam ser preenchidas, mas é um contexto cultural de naturalizações
discriminatórias”, registrou.
A luta da população negra ultrapassa a ideia de direitos iguais,
sediada está também na luta por oportunidades. Assumindo que os negros
partem de um ponto muito atrás de seus concorrentes, os movimentos de
combate ao preconceito racial pretendem superar a cultura da
meritocracia para igualar as oportunidades.
A professora Márcia Susana Lima ensina que a consciência negra que se
espera dos outros é a percepção da necessidade de abandonar o “campo da
meritocracia e perceber que nós necessitamos de igualdade de
oportunidades para avançar no processo de superação das desigualdades”.
Já em relação aos próprios negros, Lima afirma que é essencial que os
negros se apercebam de seu papel enquanto agentes deste processo
democratizante brasileiro.
A consciência negra nos próprios negros persiste ao “reconhecer nossa
ancestralidade, pois ela estruturou o processo de exclusão dos negros
em nosso país”. A gente se perceber dentro deste processo. Com relação
ao outro, buscar esta igualdade de oportunidade. Admitindo que os
elementos sociais fazem parte da formação do negro e que é importante
que desde tenra idade esteja inserido em núcleos sociais que fomente sua
participação e inserção na sociedade.
Dentre os elementos que fazem parte de sua formação estão a família,
assim como outras instituições sociais, como a escola, os grupos sociais
que a criança participa. Tudo isto vai contribuir para a formação da
identidade da criança e do adulto negro. Os referenciais que são
construídos partem das referencias da criança, para o bem e o para o
mal, mas também para o ativismo social.
Tanto a professora Márcia Lima, quanto a ativista Arísia Barros,
reconhecem que os padrões de branqueamento da sociedade brasileira
influenciam na cultura racista e preconceituosa. Para ambas é importante
que estes paradigmas sejam rompidos e que isto será possível a partir
da mudança de comportamento dos próprios negros e do investimento em
educação, com aulas sobre o continente africano, sua história e o
resultado Brasil de tudo isso.
Fonte Cada Minuto
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